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Histórias à Beira Rio, viagens e andanças com letras pelas aldeias da minha terra

"Afinal, a memória não é um acto de vontade. É uma coisa que acontece à revelia de nós próprios." Paul Auster

Histórias à Beira Rio, viagens e andanças com letras pelas aldeias da minha terra

"Afinal, a memória não é um acto de vontade. É uma coisa que acontece à revelia de nós próprios." Paul Auster

O destino está traçado

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O destino está traçado, como se fossemos parte de um mapa, daqueles mais antigos, desdobráveis, abertos ocupavam uma mesa. Escorregamos suavemente numa superficie plana, imaginando subidas e descidas, para a direita para a esquerda, consoante o relevo onde as vias estão assentes, a biblioteca ambulante e as histórias, ocorrem. Uma sucessão de acontecimentos nas viagens e andanças com letras pelas aldeias da minha terra, galgando povoações,  as paisagens rapidamente chocam connosco, variam consoante as características dos solos, dos terrenos, vegetação rasteira, árvores altas, árvores baixas, ribeiras cheias de água, cheias de pedra. Planícies onde as aves têm liberdade para voar, de se alimentar, animais pastando, ovelhas, cabras, cavalos, gado bovino, o enquadramento aptecível para impressionistas inspirados em copiar as mutações destes lugares ao longo do ano. A biblioteca ambulante não se cansa de percorrer vezes sem conta estes caminhos, transportando diáriamente as histórias, muitas vezes desejadas, outras tantas ignoradas, sempre com o objectivo de tornar a leitura um acto normal e não algo inacessível. Tal como o pintor que reproduz o ambiente em que está envolvido através dos traços do pincel de pelos macios e espessos, de pontas redondas, espalmadas, com diversos tipos de cerdas. A biblioteca ambulante modifica a existência dos mais afastados, trazendo o traço da tinta libertada pelos aparos das canetas  que o escritores transformam  em letras, depois palavras, frases, criando  histórias, impressas em folhas guardadas em coberturas moles e duras. Voltando ao mapa, o dedo aponta para a estrada, onde a biblioteca ambulante prossegue a viagem, o acesso desta vez à aldeia de São Facundo é pelo lado que fica nas costas do viajante das viagens e andanças, quando estende o braço na direcção em que o sol nasce. Após serpentear na estrada, no interior da charneca, finalmente aproxima-se da aldeia.

E se as nuvens fossem histórias?

E se as nuvens fossem histórias? Histórias de alegria, histórias de tristeza. Histórias de autonomia, de teimosia. Muitas são de rudeza, mas também as há de surpresa. Histórias grandes, histórias pequenas, histórias de encantar, de chorar. Nuvens cinzentas, nuvens brancas, altas, médias e baixas. Umas são solitárias, de algodão como a história do João Ratão. Outras têm uma grande dimensão, constituídas por gotas de chuva, semelhantes a lençóis cinzentos, às vezes azulados, depende dos momentos. São como a história Do cinzento ao Azul Celeste. Há ainda as de brilho sedoso, cheias de cristais de gelo, com gosto saboroso. São geladas, leitosas, boas para os dias quentes de verão, assim como a história Águas de verão. Gosto de as ver passar, lá no alto, têm alturas que vão apressadas, outras vagarosas, umas voam baixinho, quase as agarramos, é um desalinho, não conseguir que as histórias, ansiosas de entornar as letras, cheguem até mim. O vento leva-as para muito longe, para outro jardim, aí germinarão palavras que se tornarão histórias de embalar, de promessas, que não podem falhar. E se as nuvens fossem histórias? Histórias verdadeiras, histórias de pessoas. Histórias da história, privadas, da guerra, da sociedade, faladas através dos tempos. As nuvens sempre atravessaram, continuam a atravessar a terra, nunca deixaremos de as olhar, de tentar alcançar as histórias que nos fazem sonhar.

Numa livraria perto de si

Wook.pt - Corpos Celestes

Sinopse

Corpos Celestes narra a vida de três irmãs na aldeia de al-Awafi, em Omã. Mayya, que casa com Abdallah após um desgosto amoroso; Asma, casada por obrigação; e Khawla, que rejeita todas as propostas enquanto espera pelo seu amado, que emigrou para o Canadá.

Estas três mulheres e as suas famílias testemunham o desenvolvimento de Omã, de uma sociedade tradicional e esclavagista, passando pela era pós-colonial, até aos dias de hoje, marcados por um presente complexo.

Elegantemente estruturado e sempre tenso, Corpos Celestes é um romance que vê o seu potencial desenrolar-se na narrativa do desenvolvimento de Omã através dos amores e perdas de uma família.

Relógio D' Água, Janeiro de 2020

Numa livraria perto de si

Wook.pt - O Meu Coração

Sinopse

O meu coração é uma janela,
é um escorrega para eu deslizar.
Tanto pode estar fechado
como aberto de par em par.

O nosso coração não está sempre igual.
Quantas emoções nele cabem?

Com ilustrações e palavras bonitas e delicadas, a autora premiada Corinna Luyken, de O Livro dos Erros, leva os leitores a pensar no seu próprio coração e na importância do amor por si e pelos outros.

Um livro com algumas sombras e muita luz.

Fábula, Outubro de 2019

Olham para a biblioteca ambulante

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A primavera está cheia de pressa, ainda é cedo, o sol está forte, as cegonhas voam aos pares, é dia dos namorados. Tantos acontecimentos nas viagens e andanças com letras pelas aldeias da minha terra, numa tarde que ainda agora está a começar na aldeia do Monte Galego. Aqui os dias são realizados de coisas simples, colunas de fumo dispersas nos campos ao redor da aldeia, são indício que eles andam activos. Assim trouxessem esta atitude quando as histórias permanecem nas suas aldeias, fossem participativos, se ocupassem com a leitura no tempo em que as hortas estão adormecidas. Há excepções, o José andou a queimar os ramos que estavam dispersos no olival após a poda, as árvores ficaram amputadas dos muitos ramos que tinham, mas esta mutilação é necessária para as tornar mais vigorosas e gerarem mais fruto. O sol ainda não perdeu energia, aquece os velhos sentados à beira das suas casas, tapam a vista com a palma da mão, olham para a biblioteca ambulante atravessando devagar a ruela, que desde sempre foi a deles.

"desafio de escrita dos pássaros #2.3" Manual para iniciar relacionamentos

Com e sem manual para iniciar relacionamentos, é sempre difícil um vínculo com os Desafios de escrita dos pássaros, estes constantemente nos põem à prova. Não têm enternecimento nos temas que reclamam todas as semanas. Períodos de dias que nunca mais têm fim, tempos que nos farão puxar pelos cabelos, possivelmente alguns já não os terão, menos um problema. Ou então arranjarão outros, no decorrer desta escrita atroz, cada letra, cada palavra são contrações antes de parir cada frase. Há momentos de dores insuportáveis, abro o manual para iniciar relacionamentos, transpiro sem saber porquê, o esforço mental contagiou o resto do meu corpo, não consigo estar sossegado na cadeira, tenho alturas que me levanto, o deambular pela sala é repetitivo, até parar mais uma vez com o rosto pregado no monitor. Aquela luz forte que ilumina o texto, quase me faz perder momentaneamente a visão, sento-me novamente, sinto comichão, coço os braços, as pernas. Irado com o manual para iniciar relacionamentos, atiro com o mesmo ao chão, debruço-me no teclado e prossigo com a escrita. Que relação complicada esta, não entendo como me enamorei e assumi este compromisso de ter um texto escrito durante dez semanas. Uma atração de amor e ódio, pelo que ouço e leio nas notícias, há casos extremos onde a violência é usada reciprocamente. Não é o que acontece comigo, apesar de há pouco tempo ter arremessado o manual para iniciar relacionamentos ao chão. Foi só um ato de desespero, de querer escrever, mas algo barrava o meu pensamento, por fim descarreguei no manual para iniciar relacionamentos. Mas isto de representar a escrita com palavras aos Desafios de escrita dos pássaros é motivante, e ao mesmo tempo deixa-me na expectativa, não sei quem são ou quem é, são um grupo armado de canetas, é alguém apaixonado(a) por letras, sinais gráficos, gostam de ler, é escritora, ou escritor, para além de causar aflição todas as semanas neste que já não consegue estar um dia ausente das letras, de tudo o que elas causam, demonstram e ensinam.

 

Numa livraria perto de si

Wook.pt - História da Violência

Sinopse

A história de Édouard é difícil, íntima e dolorosa; tanto que, sem espaço para devaneios da imaginação, lhe resta apenas o relato agitado, por vezes, implacável, daquilo que a realidade um dia lhe trouxe: uma noite fugaz de amor e libertação transformada, subitamente, no mais selvagem dos pesadelos.

É com uma honestidade sem pudor, difícil de classificar, que a história de Édouard, quebrada em vozes e olhares — uma irmã que vive na província, relatórios da polícia, comentários de pessoal médico —, é também a crónica de um tempo atual, onde o ódio racial e de classe se esconde sob a imagem de uma sociedade livre, igualitária e fraterna.

Escrito com um realismo cru e brutal, História da Violência é um romance inovador que, partindo de uma confissão, explora a fratura social e o mal-estar da Europa de hoje.

Elsinore, Outubro de 2019

Onde as histórias não tiveram medo de romper

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É nos limites do território das viagens e andanças com letras pelas aldeias da minha terra, com vista para outra grande extensão, o concelho da Chamusca, que a biblioteca ambulante trouxe as histórias. Terras onde os animais selvagens não conhecem o homem, vagueiam nos montados sem se deixarem observar, ocultos pela extensa flora silvestre, terras onde os homens não conheceram a juventude. Terras onde as histórias não tiveram medo de romper, terras onde a biblioteca ambulante se tornou mais uma no seio destas gentes. Mas, não uma qualquer, trouxe as histórias, para muitos algo  estranho, enfadonho, nunca lhes tocaram, quanto mais lhes porem a vista em cima. São as mulheres que ousam levar as histórias para os seus lares, são as mulheres que não param quietas, trabalham no campo, cozinham, dialogam umas com as outras e ainda têm tempo para as histórias. Terras onde o viajante das viagens e andanças ganha asas como o falcão que ainda há pouco sobrevoava a pequena planície procurando alimento, passando para as mãos dos que querem ler, dos que não sabem que querem, a comida intelectual. Terras que nunca mais acabam, terras que não quero esquecer.

 

Numa livraria perto de si

Wook.pt - De Língua Afiada

Sinopse

Susan Sontag, Dorothy Parker, Hannah Arendt, Rebecca West, Joan Didion, Mary McCarthy ou Nora Ephron, entre outras — o que têm estas mulheres em comum? O talento, a argúcia, a precisão do pensamento, o brilhantismo e o arrojo das opiniões que defenderam desassombradamente. São os nomes de mulheres que (cada uma à sua maneira) correram riscos, defrontaram preconceitos, desafiaram o poder masculino na imprensa e na cultura dominante — e moldaram a história cultural e intelectual do século XX —, pelo que escreveram, pelo que viveram e pelo extraordinário legado que devemos partilhar.

Quetzal Editores, Janeiro de 2020