Os próximos dias são bons ...
A escolha está difícil na bancada da roupa da tendeira, na biblioteca ambulante é sempre assim com os leitores. Agarra com as mãos umas calças, expõe-as às clientes indecisas, que não sabem o que comprar. Quando há leitores com ausência de determinação, por desconhecimento de algum autor, de histórias disto e daquilo, sou sempre eu a recomendar, receando no entanto a possibilidade de não gostarem da história, e por isso perderem o interesse de frequentarem a biblioteca ambulante. Vivemos a Páscoa, as pessoas procuram roupa nova, a primavera está quente, precisam de vestuário fresco. Querem estar renovadas, bem apresentadas para receberem filhos e netos, ou família afastada a regressarem às origens. Os próximos dias são bons para a leitura, na esplanada, num jardim, na sombra de uma árvore, a pausar conversas, para reflectir a passagem que atravessamos. A biblioteca ambulante sem leitores, logo ali a mulher na sua bancada continua a mexer na roupa exposta, desdobra, volta a dobrar, os clientes obrigam-na a percorrer o espaço de um lado para o outro. As trocas não acabam, retiram o dinheiro das carteiras, a vendedora coloca-o no bolso da bata que traz vestida, quando é necessário também tira o troco. Comércio desprovido de sofisticação, simples, dá-se algo por outra coisa, sem apontamentos. Ambas ficam quitadas, compras e vendas como sempre se fizeram, desembaraçadas cada uma vai à sua vida. Foi o que fiz, após ter cedido por algum tempo histórias a duas leitoras, confiar nos dias de hoje não é bom negócio, mas instituições como as bibliotecas constroem este comportamento, acreditam na verdade dos desejos dos leitores.