Saber ler os desígnios do céu ...
Os raios solares aquecem a aldeia do Souto, vêm-se pessoas na rua, paradas, de mãos nos bolsos, a lagartearem ao sol. Estimulam os ossos mirrados pelo tempo, pelo trabalho na terra, a mesma que um dia os irá acolher. As folhas rodopiam num recanto, talvez seja o lamento profundo da aldeia. O exalar triste desta e doutras aldeias da minha terra, a escassa população, a idade avançada das pessoas, o isolamento geográfico. Resignaram-se, não têm forças para alterarem o estado das coisas, em surdina falam, comentam. Abrem rasgos na terra, nas hortas semeiam favas, ervilhas, o que o carácter do clima deixa nesta altura do ano. Andam o tempo todo nisto, a geada está atrasada, também é necessária para além da chuva, é uma ciência difícil, a de amanhar a terra. Não há livros a explicar isto bem, é preciso praticar, saber ler os desígnios do céu, amar o campo. A biblioteca ambulante é um ponto amarelo de esperança, a deixar um rasto luminoso de informação, incentivando a dependência à mesma. Mas, não chega. O sopro do vento é frio, um desanimo para os próximos dias e meses que se avizinham, nas ruelas da aldeia é o único que se atreve a caminhar, afugentando tudo à sua frente. Se não fossem as portas da biblioteca ambulante estarem apenas entreabertas, entraria por aqui adentro, a sacudir as folhas das histórias em todos os sentidos. O resultado poderia ser uma condimentada sopa de letras bem quente, assim aparecessem leitores.