Uma águia paira sobre ...
Os primeiros alvores anunciavam o que seria a temperatura, que incomoda ao início desta tarde. Está calor, parece verão, não se despediu há muito de nós. Deixou para trás uma sensação produzida pela acção do sol, um simpático nível térmico, a roçar o exagero, na estação meteorológica em que estamos. Depois de uns dias mais frescos, com alguma chuva à mistura, voltar aguentar tudo outra vez, o calor, a melancolia, o desalento, do tempo a correr devagar debaixo de um sol escaldante. Não quero isso, os leitores não querem chegar à biblioteca ambulante inflamados, como se alguma ignição os pusesse a arder. Prefiro-os assim, quando são as histórias a exercerem a influência, para os pôr em movimento e seguirem as palavras, nos caminhos desbravados pela caneta dos escritores. Uma águia paira sobre um terreno descampado, de fazer inveja às máquinas voadoras, imagino os seus olhos, fixos nalguma presa, um coelho distraído, um réptil absorvendo energia solar, para suportar a noite fria, o próximo inverno, no interior do seu buraco. Ali está ela, sempre vigilante ao que se passa cá em baixo, a biblioteca ambulante não é presa para ela, os predadores das histórias não estão atentos como a águia está, até ao momento não pressentiram a presença dos animais a correrem nas páginas, saltando os obstáculos, fugindo uns dos outros, do homem que os prende nas armadilhas, os abate com tiros certeiros de espingarda. Agora são os pombos, a lebre, caça feita a pé, as principais vítimas, a seguir vem o período em que as perdizes, os coelhos, não têm descanso. É com naturalidade que ouço nos dias em que se pode caçar, o som das espingardas a dispararem, ou avistar caçadores a caminharem na charneca rodeados pelos cães a farejarem por entre a vegetação rasteira. A qualquer momento saltar um animal silvestre, ziguezagueando, tentando evitar os chumbos mais rápidos que o vento. Ou um caçador entrar na toca das histórias, apontando imediatamente a visão experiente a uma história. Nos dias seguintes alimenta-se desta, saboreará até esgotar a carne dos ossos, lendo até ficar saciado.