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Histórias à Beira Rio, viagens e andanças com letras pelas aldeias da minha terra

"Afinal, a memória não é um acto de vontade. É uma coisa que acontece à revelia de nós próprios." Paul Auster

Histórias à Beira Rio, viagens e andanças com letras pelas aldeias da minha terra

"Afinal, a memória não é um acto de vontade. É uma coisa que acontece à revelia de nós próprios." Paul Auster

29.05.25

O cão não encontrou nenhum ...


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A coragem do cão é enorme atravessando o largo a castigar as almofadas das suas patas, debaixo dos 43º Celcius. Não sei de onde veio, onde vai, se fosse atrás dele, talvez encontrasse um lugar fresco. Os leitores acercavam-se do largo, estafados, pela severidade da canícula, apercebendo-se do vazamento das histórias. Desapontados, olhando na cara uns dos outros, rostos vermelhos, furiosos, ansiosos. Tentando perceber a razão da ausência da biblioteca ambulante no largo da aldeia. Não viram o cão, se tal acontecesse, seguiam-no como fez a biblioteca ambulante. O cão não encontrou nenhum lugar fresco, anda perdido, não consegue encontrar o sítio onde pertence. As histórias nunca saíram do largo da aldeia, estão a aguentar o calor intenso. O viajante das viagens e andanças afoga-se na sua transpiração, no interior da biblioteca ambulante. Ponho em duvida, o surgimento de leitores, estão recolhidos, em casa, dormindo a sesta. Não estão extraviados, procurando a frescura, estão agradavelmente protegidos da temperatura elevada. Se calhar, um livro na mão a termina-lo, ao mesmo tempo olhando o relógio, para não deixarem escapar a biblioteca ambulante para outra aldeia. Onde um leitor atacou de frente a massa de ar quente, aguentando, o brilho intenso, capaz de ferir a visão daqueles que não usem óculos de sol. Foi sob o distúrbio meteorológico solar, que andou a remexer nas histórias, seleccionando ao longo das prateleiras. No final da exploração, encaminhou os escolhidos ao viajante das viagens e andanças. Este lançou-os no módulo de empréstimos, para não perder o contacto destes.

28.05.25

Cres.ser nas histórias da BIA


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Um tractor abastecido da alfaia agrícola, avança lentamente, arrastando as ervas por onde passa, puxando-as com força pelo princípio. As ervas cresceram, estão sem controle, o risco de incêndio é enorme, há que preparar os terrenos para receberem em segurança a violência do calor. A poeira no ar é visível quando a biblioteca se aproxima do local onde decorre o desbaste. Na passagem pela aldeia da Bemposta, há, quem ainda, termine a caiação dos muros. A festa anual da Ascensão na aldeia, inicia-se amanhã, tem de estar tudo bem apresentado. A sombra do plátano não é suficiente para eliminar o calor no largo em Alferrarede, são poucas as pessoas que o atravessam. Uma delas veio na direcção da biblioteca ambulante, traz um livro na mão. A temperatura elevada não conseguiu demover a leitora de ausentar-se da sua casa, de vir renovar a leitura. Há «Manta de histórias» concluídas, há memórias perpetuadas em  partes, ou sobras de tecidos. Há leitoras felizes pela escrita diferente. Há, Cres.ser nas histórias da BIA.

27.05.25

Vivem o momento com ansiedade ...


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Um homem montado na sua bicicleta abranda a marcha ao aproximar-se da biblioteca ambulante. Até agora foi a única pessoa na aldeia do Souto a percorrer a rua. Apesar de travar a celeridade, não chegou a parar, olhou as histórias fugazmente, deixou-se ir, aproveitando a inclinação da rua, quando esta alcança o coreto da aldeia. Levantou-se cedo, sobre a mesa da cozinha uma caneca de café esperava-o, fumegando, a bandeira de xadrez agitando-se para o início de um dia activo. A mulher disse-lhe adeus com o olhar na soleira da porta. Vinha da horta, quando passou na rua, perto da biblioteca ambulante, andou a regar, a temperatura elevada, não permite distracções, com a água na terra. Nas plantas leguminosas, em crescimento, as primeiras flores, que antecedem o aparecimento dos frutos, necessitam de estar vivazes, com os pés molhados. O sol avança, as sombras fogem da rua, na direcção da frontaria das casas. Vão impedir o fervor da tarde, de estragar o bem estar das pessoas, depois de uma manhã a cuidarem dos terrenos hortícolas. Na aldeia de Sentieiras, o tempo entendeu-se com as leitoras, deu-lhes mais tempo para terminarem a «Manta de histórias». O tempo urge, a apresentação dos pedaços de histórias, cosidas com linhas, auxiliadas por agulhas nas folhas cruas, está para breve. Vivem o momento com ansiedade, noites mal dormidas, a coser, a desfazer, a recompensa está à vista da objectiva do viajante das viagens e andanças, Querem chegar depressa ao final da história. Perdem-se no meio dos novelos, voltam atrás, iniciam outra vez, agora com mais atenção, não deixam letras por coser. Lêem mais devagar, assim têm firmeza a enfiar a agulha no pano, estão melhor preparadas para interpretarem as memórias com as linhas.

 

23.05.25

Cosem estórias com linhas e agulhas ...


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A tarde perdeu as estribeiras, com a temperatura a galgar o limite estabelecido neste mês. As frontarias brancas, das casas do largo do café, na aldeia da Concavada, sobressaem com o brilho estampado do sol. As molduras de cor azul em torno das janelas, a linha da mesma cor, a delinear as fachadas. Em tudo semelhantes a pedaços de pano, bordados por mãos experientes na costura, na vida. Paredes com histórias, protegendo bocados de memórias, trechos de lembranças, fixados nos panos crus. Suportes, de escritas fantasiadas na arquitectura popular, na costura doméstica. Artes e Ofícios, transmitidos ao longo de gerações, em caixas de conservação sobre experiências anteriores, manifestando-se, quando o momento assim o exige, através de pequenos apontamentos. A Manta de Histórias, conquista leitoras, que cosem estórias com linhas e agulhas.

20.05.25

Imaginação para escrevermos na face da ...


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O sol na ficção literária pode ser uma nave não tripulada, imóvel, a disparar traços de luz contínuos. Fulminando o planeta, aquecendo a água dos oceanos, colocando a atmosfera em movimento. Um pintor criando a melancolia o renascimento, o desejo, a introspecção. Na Aldeia do Mato, povoação de braço dado, com o rio Zêzere, a biblioteca ambulante, arremessa palavras, acertando nas pessoas, quando, caminham próximo do auge, das histórias. A sombra, lentamente conquista o espaço exterior do pequeno depósito, onde carregadores municiados, de palavras esperando serem soltas subitamente. Felizardo é aquele que recebe o tiro fatal, um ferimento aberto para toda a vida. As casas da aldeia, pintadas de branco, sem misturas, cativam o olhar, a imaginação para escrevermos na face da aldeia. A biblioteca ambulante, não é o sol, é a utopia que todos devem experimentar, mesmo privados de uma sociedade ideal.

19.05.25

Desconfio, de quem os convocou...


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O ar quente entranha-se no interior da biblioteca ambulante, as silhuetas no horizonte assemelham-se a bailarinos dançando no céu. O som contínuo, dos dragões a sobrevoarem as histórias inquieta-me, o silvo afasta-se, regressa pouco depois, de  espreitarem as outras aldeias da minha terra. Temo pelas histórias, quando sopram o fogo. Desconfio, de quem os convocou, o isolamento das terras do interior, a sobranceria dos eleitos. O contentamento, a despreocupação, caminham numa rua da aldeia, ao encontro de um destino desconhecido, seja, o local que escolheram, talvez, o cabo das tormentas. Eles lá sabem. As nuvens continuam a passar, não sei, serão as mesmas que passaram ontem, tenham ido ao outro lado do mundo, estão a regressar outra vez. As nuvens não se gastam, o mesmo não acontece nas pessoas. Desgastam-se, perderam a paciência, não aguentam mais o aspecto sombrio, a expressão de tristeza das nuvens flutuando no ar. No Cabrito, as pessoas estão esgotadas no largo, deixaram o descontentamento para trás, seguiram o exemplo da alegria e da tranquilidade. Preferem a ligação na crença. Em vez de apostarem no sonho, criado pela imaginação, na leitura das histórias. Na experiência, da evolução da humanidade.

 

16.05.25

O verão chegou ...


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Foram alguns meses a transitar na estrada a levar a biblioteca ambulante, às aldeias das Bicas e Vale de Açor, a passar por cima de pequenas partes, desta, em muito mau estado. Finalmente, hoje foi com satisfação que a biblioteca ambulante, a transpôs, sem estar ainda concluída a intervenção necessária, mas, a progredir para contentamento dos fregueses, e do viajante das viagens e andanças. Não fosse as pessoas destas aldeias a reclamarem, as deformações estariam por reparar, até agora. O verão chegou. Não é altura do verão chegar. Passou à frente da primavera, no tempo em que não devia acontecer. Na aldeia das Bicas a sombra da tília, abraça a biblioteca ambulante, em sinal de acordo. A luz das histórias ilumina os poucos habitantes da povoação rural. O peixeiro estacionou a sua carrinha, não muito longe da tília, o som da buzina não atrai ninguém. O verão prematuro, e as sardinhas assadas na brasa, têm um pacto, dispensam de formalidades. Então, venham à peixaria ambulante, à pesca da sardinha. Venham à biblioteca ambulante apanhar palavras no oceano de histórias. Sem armadilhas, usem a razão, as mãos e as pernas, para nadarem daqui para fora. Aproveitem o verão imprevisto, os fragmentos de esplendor, a estripar histórias, a comer sardinhas. 


 

 

 

15.05.25

Sobrevoando por cima da ...


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A biblioteca ambulante não progride nas viagens e andanças como as nuvens, vai na direcção das aldeias da minha terra, segue os futuros leitores, acompanha os leitores. Nas nuvens estão aqueles  que vêm com regularidade junto das histórias. Avançam com intuição nas histórias que lêem, há dias, ninguém os consegue seguir, noutros, não há melhor do que estarem sentados num banco, no jardim, a observarem panoramas.  As histórias são substâncias, puxam a ponderação, desviando os leitores de outras direcções menos boas. Dão-lhes asas, iguais às nuvens, sobrevoando por cima da biblioteca ambulante, vão ao fim do mundo e voltam mais experientes. São anabolizantes, aumentando significativamente, a capacidade dos leitores, de saberem trocar ideias sobre um assunto. As histórias são máquinas criadoras de vontades. São estórias das histórias, da humanidade, do tempo. Na aldeia da Barrada, o sol aperta o viajante das viagens e andanças, encolhe as pessoas, limita-as ao espaço das suas casas. O café Areias, no largo da aldeia, encerrou as portas agora mesmo, sem clientes no período da temperatura mais elevada no ar.  Sobejam as sombras no largo, o fremir da abelha, iludida, no meio das brochuras coloridas, nas estantes. Canteiros, de flores de papel, onde os leitores absorvem o néctar. Um jardim público, onde todos possam cheirar as flores de papel. Arranca-las pela haste, voarem até às nuvens, e plantar de novo as flores de papel nas nuvens. Pequenas áreas de nuvens ajardinadas, transformariam o céu num grande jardim, o mundo seria melhor, debaixo da influência das flores de papel. Em vez da presença do peso, lentamente, destruidor, das autocracias, das guerras.

14.05.25

No campo, cheio de flores amarelas


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Os campos amarelos, são minas de ouro à superfície, mais, do que propriamente flores dançando ao vento. De uma riqueza natural, atraindo o olhar de quem passa, as flores amarelas podem ornamentar, em forma de arco semicircular a cabeça das mulheres. As aldeias da minha terra, as rainhas, das viagens e andanças. As pessoas, os leitores, todos os que queiram ver, cheirar e sentir, as pétalas. As folhas florais que compõem, a história para levar para casa, não para colocar numa jarra, ornamentando um compartimento. Para abrilhantar a mente, equipar quem lê, da rejeição que existe à interioridade. Na aldeia em Vale Zebrinho, um homem anda a pintar uma parede, ao som da música de um rádio. O som espalha-se no espaço envolvente, na biblioteca ambulante, numa fumaceira de notas musicais. Interrompidas de vez em quando pela voz da locutora, pelos anúncios da publicidade. A trincha, empurrada pela mão do homem, alastra a tinta na parede, uma, duas vezes. As que forem necessárias, até ficar imaculada, uma folha branca, apta para receber a caneta do escritor. O homem ao pintar a parede, reescreve a história desta, repõe as memórias gastas pela passagem do tempo. A mulher do homem trouxe-lhe a bucha, para lhe atenuar a fome, preparar o estômago para uma cerveja fresca. É isso que faz o homem, enquanto emborca pelo gargalo da garrafa, a cerveja, a mulher olha-o embevecida. Um acto de amor, na aldeia acontecendo à frente dos meus olhos, simples, verdadeiro. No campo, cheio de flores amarelas.

13.05.25

A chuva não foi meiga a cair, ...


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A neblina está presente na aldeia de Rio de Moinhos, são dez horas da manhã, e os casacos fazem parte da indumentária das pessoas. A primavera está a olhos vistos moribunda, não há dia em que não chova, sem sol, ou faça algum frio. Sempre que a noite chega, fico em apuros, em casa, num canto da sala, há uma manta de sobreaviso, para o caso de ser necessária, para me tapar. A lareira está fora de hipótese, a insuficiência de lenha, não alimentaria o vão aberto na parede, uma a duas noites seguidas. A solução, será a primavera de uma vez por todas, enfrentar os resquícios do inverno, empurra-lo para outro hemisfério. A esquina da rua, que desemboca na biblioteca ambulante, não deu sinal, até ao momento, da primeira leitora da aldeia a contorna-la, trazendo o saco com os livros para devolver. Apesar das nuvens o sol está desperto, agora, aquecendo melhor o viajante das viagens e andanças, a brilhar na aldeia. A chuva não foi meiga a cair, foi uma passagem breve, agora estão outras nuvens sobre a biblioteca ambulante dispostas a despejarem outra quantidade de água. A carrinha do peixeiro está a apitar. Chegou depois, e as freguesas já a rodearam. Uma quer chocos, a outra continua a observar tudo muito bem. Escolheu carapaus, leva dois sacos. Vais ser uma festa, com as brasas vivas, grelhando-os, de um lado e outro. Colocando-os a jeito para acompanharem com uma salada de alface e tomate. Fritos, no dia seguinte apanhando um dia de sol, deitados na  cebola, não há escabeche melhor. 

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