O burburinho da chuva a cair na rua, sem poder abrir as portas da biblioteca ambulante, balançou-me a fazer parte das histórias. Invadir, trilhar as linhas imaginárias, onde as letras adicionadas às palavras criam frases, levando a acontecimentos. O dia cinzento tornou o espaço onde os livros estão dispostos mais obscuro. Intimista para incutir a abordagem com as diversas personagens, caminhando sem destino procurando imprevistos. Estar face a face com algumas figuras, obras da (...)
Onde param as mulheres sentadas no banco de alvenaria, sempre que a biblioteca ambulante permanece no largo São João de Brito. Onde estarão as leitoras e as que aguardam pela padeira diariamente, não podem ter desaparecido subitamente. O largo vazou, não há histórias para ouvir, para dar, o mexerico, motor da oralidade de lugares estará danificado, ou será apenas coincidência ter vindo à aldeia novamente e deparar com esta desocupação. As hortas neste princípio de outono (...)
A cor dourada da manhã não estimula os leitores saírem de suas casas, talvez o bafo frio do vento os retenha. Enganei-me, a carrinha da padeira a buzinar ruidosamente, ainda não tinha alcançado as primeiras casas da aldeia, retirou imediatamente alguns de casa. Outra vez traído pela vontade da presença de amantes da leitura, logo estes não se prendem às histórias para manterem a estabilidade emocional. Com os sacos presos nas mãos, não vá a aragem endiabrada levá-los, (...)
Todas as vezes que chego à sua aldeia, está sempre sentado com o saco das histórias aos seus pés, encontro-o com o tronco curvado e olhar errante, quase sempre é esta a postura. Hoje cheguei primeiro, entra colocando o saco no pequeno balcão, imediatamente retira o cartão de leitor, como se não soubesse eu o nome do único leitor da aldeia, dirigi-se para as histórias como quem vai à fonte matar a sede. O assunto da conversa é sempre a horta, a escassez de chuva para (...)
O homem velho estava com um olhar radiante, manobrava o volante da biblioteca ambulante tentado estacionar o melhor possível, logo ali na entrada da porta da sua casa os seus olhos cintilavam. Parecia que aquelas pequenas luzes me queriam iluminar o local onde iria demorar-me. Ao lado, a sua filha sentada, deduzi que as férias a tinham trazido à aldeia visitar o pai. Lembrei-me da conversa que tinha tido com ele na última presença da biblioteca ambulante na aldeia, a sua mulher (...)
O Ti Chico comprava pão, ao mesmo tempo questionava o padeiro se queria comprar mel, tem para cima de cem colmeias, segundo ele. Ouviu do padeiro que o avô praticava o mesmo ofício, não conseguindo concretizar um possível negócio. Na aldeia as manhãs no largo são sempre assim, sentadas, as pessoas esperam pelo homem que traz o pão. A biblioteca ambulante não tinha calado o motor e o viajante das viagens e andanças já tinha descoberto a existência de um furo num pneu. A sorte (...)
A padeira não demorou muito tempo, após a biblioteca ambulante a ter ultrapassado, não houve corrida nenhuma, uma mulher com um andamento pesaroso vai na direcção do largo. Pouco depois juntaram-se mais, a padeira estacionou, como se tivessem molas a impulsiona-las, levantaram-se ao mesmo tempo com os sacos na mão. Rapidamente ficaram cheios de pão, voltaram a sentar-se, segundo elas houve orvalhada pela madrugada, uns chuviscos fizeram a sua aparição sem molharem a terra (...)
A sombra da laranjeira não alcança a biblioteca ambulante, estacionada no pequeno largo na aldeia do Tubaral. Isto é, são as únicas que ocupam o espaço, não há ninguém por perto a não ser um cão empoleirado no muro que ladra desalmadamente ao viajante das viagens e andanças. Um estranho próximo do limite do lugar que protege, num veículo cheio de histórias, aos olhos do animal é muito diferente daquilo a que está habituado a presenciar. As mulheres que sempre estão aqui, (...)
O açoite do vento não é violento como o que ocorreu ontem, embora tenha momentos em que perde a calma puxando o ar frio novamente. Só a paragem da padeira tirou as pessoas de casa, a biblioteca ambulante, estacionada no Largo de S. João de Brito na aldeia do Tubaral, onde tudo acontece, não tinha sequer visto um gato. A buzina estridente alertou as pessoas, apressadas, tremendo de frio, chegaram junto da carrinha da padeira e das histórias. A necessidade do pão, trouxe o apetite (...)
Sem contemplações o vento expulsou a poeira, a nitidez está a regressar à normalidade. Na planície a manada não demonstra interesse naquilo que a envolve, com o focinho e o olhar pousado na erva, avançam pela terra plana como se fossem cortadores de relva. Irrompendo com intervalos de curta duração o sol esforça-se para abrir à força a cápsula que cobre a aldeia, mas não passa disso mesmo, a densidade da cobertura é resistente. A tarde progride vagarosamente, as (...)