A primavera, não tem obstáculos ...
Há uns dias atrás em conversa com um leitor a propósito dos tempos que testemunhamos actualmente, sobressaiu o acontecimento do 25 de Abril de 1974. Perguntei, o que fazia nesse dia, que mudou o paradigma político e social até então. Respondeu que estava a trabalhar, na fundição do Rossio ao Sul do Tejo. Soube da notícia, da queda do governo de Marcelo Caetano, nesse dia, até de madrugada não tirou os ouvidos da telefonia. Na fábrica o dia de trabalho decorreu normalmente. O melhor estava para vir ao mencionar, uns dias antes do golpe de estado, os operários tinham realizado uma greve ao trabalho, foram doze horas, a reclamarem um dinheiro que lhes deviam, que pagaram depois, e melhores vencimentos. O bastante para surgirem imediatamente polícias da PIDE, a desordem teve início na metalomecânica, um torneiro e um ferrador, foram os cabecilhas, incluiu-se também como um dos que liderou o protesto. A polícia política, segundo ele, andou por lá a investigar, a tentar saber quem foram os mentores da iniciativa. Um dos patrões desconfiou que o leitor, fosse um dos activistas, ao que o outro, contrapôs com veemência, qualquer impossibilidade de ele ser um dos mentores de tal atrevimento. Uns dias após estes acontecimentos deixou a fundição para ir tentar melhor salário na Líbia. Mais tarde regressou outra vez à mesma fundição, o patrão que suspeitou de uma eventual acção da sua parte no tal dia da greve, perguntou-lhe, se vinha com as mesmas ideias, ou se trazia outras. Afinal, segundo ele, esse patrão, nunca descartou a hipótese de ter sido ele, um dos agitadores, naquele dia na fundição. O som da água, a sair da bica e a precipitar-se no tanque, em Martinchel, convence-me que tudo está bem. A estabilidade climatérica, com as temperaturas a manifestarem-se nos períodos correctos, a democracia a prevalecer em todos os países dos cinco continentes. Sem conflitos, todos a favor de um mundo melhor. O aliciamento depressa termina, o som, do motor da biblioteca ambulante, a preparar-se para se pôr em marcha para outra aldeia, fechou a água que sai da bica. A tarde está escondida numa fina cortina, sem tecido suficiente para impedir os raios solares atingirem o viajante das viagens em andanças. A temperatura elevada, retira das gavetas e roupeiros, roupa adequada a suportar os 30º ao sol. A primavera, não tem obstáculos para a deter no seu processo de imigração, ainda bem, traz vida nova. Seria bom que o recomeço trouxesse leitores novos, refugiados a deixarem a solidão e o isolamento, atravessando o mar do conhecimento na barca das histórias.