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Histórias à Beira Rio, viagens e andanças com letras pelas aldeias da minha terra

"Afinal, a memória não é um acto de vontade. É uma coisa que acontece à revelia de nós próprios." Paul Auster

Histórias à Beira Rio, viagens e andanças com letras pelas aldeias da minha terra

"Afinal, a memória não é um acto de vontade. É uma coisa que acontece à revelia de nós próprios." Paul Auster

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A charneca canta e chora de alegria, as plantas selvagens molham as raízes nas pequenas correntes de água, que continuam à superfície do solo. A biblioteca ambulante, acelera nas estradas estreitas, escoltadas por sobreiros e carvalhos, as viagens e andanças prosseguem outra semana pelas aldeias da minha terra. No largo do Café Areias, com vista privilegiada, para a charneca abastada, para uma leitora da biblioteca ambulante, sentada, numa cadeira, na varanda da sua casa, protegida na sombra de um chapéu de esplanada. As suas primeiras palavras foram de que não tinha lido completamente a história que levou da última vez que aqui estive. Tem na sua posse outra que lhe chegou inesperadamente às mãos, um barbicaho, resolvido, lendo ambas, disse. Intervalando os momentos da leitura com o preenchimento dos quadrados em branco das palavras cruzadas. Processo ao qual estava absorvida, quando a biblioteca ambulante estacionou defronte da sua casa. Ao longo do percurso pelas aldeias da minha terra, hoje, vi roupa no estendal a secar, nos lugares mais improváveis. Afastadas das casas, onde cobrem as intimidades, agasalham, e calçam os proprietários destas, no meio de áreas verdejantes, planas como réguas. A roupa, assim estendida é uma armadilha para caçar o vento a fustigar aquelas paragens. Esgota a energia deste, secando os tecidos molhados na lavagem. Espalham no ar pudores, pela força da limpeza, não somos perfeitos, lavamos a alma na leitura, com chapadas de palavras que nos abrem os olhos. Arrepiam o nosso corpo, como a água gelada do mar, batendo-nos com força, remexendo o pensamento. É o que faz a leitora, à beira mar de um oceano de palavras. Molham-lhe os pés, sempre que a onda de palavras se desfaz nas páginas de areia, numa enorme sopa de letras. Exercitando as células nervosas, tentando a reunião acertada das palavras, a leitora estanca a possibilidade, da alienação conquistar a sua independência. Os limões pendurados nos limoeiros, assemelham-se a confetes espalhados nas viagens e andanças, não é por acaso que o Carnaval está a chegar.