A surpresa vence sempre, ...
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A sensação de bem-estar na celebração dos cinquenta anos do 25 de Abril, parece ter sido ultrapassada. O início da semana não sofre qualquer alteração, a preguiça, os dias sem viagens e andanças, é sempre um regresso fatigante. Os leitores talvez padeçam do mesmo incómodo, até ao momento nenhum apareceu na biblioteca ambulante. No bairro onde os prédios altos, e fraccionados, as casas independentes, evidenciam um conjunto de pessoas interessantes. Não anunciam novidades, infelizmente esta quantidade de pessoas não se declara leitora na biblioteca ambulante. Os horários de trabalho não são coincidentes com a presença das histórias no bairro. Mas, as pessoas, nas varandas a estenderem a roupa, a entrarem na mercearia, no café, ou a tentarem perceber a vida alheia. O desejo de saberem, espreitando nas janelas, o que faz o veículo de portas abertas, de cores apelativas, estampas com livros, flores, monumentos a perpetuarem história edificada, e doces tradicionais de Abrantes. Fazendo acreditar que ali se vende bolos a alguns curiosos. A surpresa vence sempre, quando olho para os rostos cheios de espanto, todas as vezes que percebem que o interior desta, está guarnecido por livros. Podiam trazer para mais perto a vontade de saberem o propósito do veículo alegre no bairro. Terem força para transporem as portas, a capacidade de ocuparem o tempo em casa a lerem. Viajando nas páginas sem fim, o céu é o limite, foi assim que Júlio Verne desafiou a faculdade de inventar, com a obra Da Terra à Lua, em 1865. Actualmente a linha é outra, experimentem, entrarem na brochura, na encadernação, cápsulas onde encontrarão os instrumentos necessários aos voos literários. Não foi assim que aterrei esta tarde na aldeia da Lampreia, não posso mencionar a biblioteca ambulante como uma desconhecida aos olhos de quem aqui habita. São alguns anos a permanecer, neste fim do mundo, das aldeias da minha terra. Há pessoas ligadas às histórias, não aparecem, para mim, deixaram de serem leitores, não os vejo, morreram, desapareceram. A biblioteca ambulante continua a regressar, testando a sua capacidade de resistência à fraca disponibilidade da população. No céu as nuvens viajam apressadas, filhas do vento, embarcações tripuladas por argonautas, em busca da página, ou lugar, para se conservarem memórias, se fixarem as palavras ainda não escritas.