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Histórias à Beira Rio, viagens e andanças com letras pelas aldeias da minha terra

"Afinal, a memória não é um acto de vontade. É uma coisa que acontece à revelia de nós próprios." Paul Auster

Histórias à Beira Rio, viagens e andanças com letras pelas aldeias da minha terra

"Afinal, a memória não é um acto de vontade. É uma coisa que acontece à revelia de nós próprios." Paul Auster

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O Manuel regressou à sua terra definitivamente. Conheci-o nas viagens e andanças. Frequentava o Centro Social na aldeia, não foi um leitor na acepção da palavra. Aprendeu a ler com o tio, desde muito cedo começou a trabalhar, acompanhava-o nas campanhas agrícolas. Nos momentos de lazer, o tio deu-lhe a conhecer as primeiras letras, não ia além da leitura de jornais, sabe escrever o seu nome. Sempre que a biblioteca ambulante regressava, lá estava o Manuel a espreitar as gordas nos jornais, junto à porta grande da biblioteca ambulante, relatava acontecimentos da sua vida. Criou-se empatia, o Manuel jamais deixou de comparecer junto das histórias, sempre que esta visitava a aldeia. Passava os dias no Centro Social, as noites ia para sua casa, noutra aldeia, o que o preocupava, não se sentia confiante estar de noite sozinho. Um dia fomos surpreendidos mutuamente, avistamos-nos noutra aldeia, a norte do rio Tejo. Disse-me que estava a frequentar dia e noite o Centro Social, desta, instituição localizada no mesmo largo da permanência da biblioteca ambulante. A partir daqui fomos-nos encontrando, confessou-me, gostar de ali estar, mas as saudades de onde tinha vindo, da sua aldeia, avivam-lhe memórias. Deixei de o ver, até encontra-lo novamente num lar, na cidade, recebeu-me com um largo sorriso, estava mais perto da sua aldeia. Assim continuamos, até me dizerem que o Manuel estava no hospital, nunca mais o vi. Ontem informaram-me da sua morte.