Resta-lhes serem leitores ...
Anda uma abelha na biblioteca ambulante, de um lado para o outro a inspeccionar as histórias, iludida pelas cores das brochuras, julgando serem flores. Um jardim de histórias, de odores, e sabores, néctares aromatizados por óleos da escrita. Palavras ao vento numa pradaria de lembranças, de paixões, poeiras do tempo persistindo na relação com os leitores. Um ecossistema de ligações afectivas, de comportamentos, de capacidades de comunicação. Uma fonte de fascinação para os leitores, para quem o conhece pela primeira vez. Foi o que aconteceu com a abelha, perdida na grande planície, aprendendo, que não é o seu meio ambiente. O sol queima o meu braço exposto aos seus raios, a manhã evolui na aldeia do Brunheirinho, com as mulheres a rodearem a carrinha do merceeiro. Uma delas passou próxima da biblioteca ambulante, olhando desconfiada, talvez, pelos sons dos personagens que pululam diariamente nas histórias. Mais adiante, noutra aldeia, em Vale de Horta, ao entrar no pequeno estabelecimento, afastando a cortina mosquiteiro, ouço uma voz a dizer, aí vêm os jornais para lermos. O café é o ponto de encontro dos homens da aldeia, estão reformados, ocupam o tempo nos terrenos cultivados com hortaliças e legumes, ou vêm ouvir-se uns aos outros, bebendo um copito de vinho. Foi com satisfação que recebi aquela voz vinda da profundidade do café, não são leitores no sentido da palavra, nunca entraram na biblioteca ambulante, mas, lêem o jornal que lhes deixo, gostam de saber as notícias do território das aldeias da minha terra. O largo do Cabrito continua a ser um lugar de passagem, de encontros e desencontros, de paragens, para conversas na esplanada em ambos os cafés que o limitam. A tarde soalheira permite que as esplanadas sejam um bom local para se estar, beber um café, fumar um cigarro, esgotando ao mesmo tempo que este, as novidades mais recentes do lugar. Assim se delongam os dias destas pessoas que já fizeram de tudo na vida. Resta-lhes serem leitores na biblioteca ambulante.