O primeiro olhar pelo jornal é igual ao que fazemos perante uma vitrine repleta de bolos. Perdemo-nos na variedade de palavras, as massas, as texturas, os recheios, um conjunto de cores e sabores para lermos em casa, no sofá, seguir as frases umas a seguir às outras. Ler é importante, estar informado ainda mais. A assiduidade da biblioteca ambulante nas aldeias, promove, sem os leitores notarem, hábitos de leitura. Os gestos, a paixão de olharem para as palavras, viajarem pelas (...)
Hoje o dia promete temperaturas elevadas nas aldeias da minha terra, não é novidade por aqui o intenso calor. A boa nova foi uma leitora vir devolver a história lida, e levar outra, um bom sinal para o início de semana de viagens e andanças. O silêncio no largo é interrompido pelo som das pás, dos martelos, da betoneira misturando a solidão e o isolamento. Serão posteriormente fixados nos blocos de argila para serem eliminados pela tinta que cobrirá de novo as paredes de uma (...)
No largo do coreto as novidades escasseiam, exceptuando o avanço do tempo sem refrear a continuidade da canícula. O relógio da igreja faz-se ouvir anunciando a meia hora em falta até às dezasseis horas da tarde de mais um dia de viagens e andanças. Aqui os leitores são como as novidades, vêm quando lhes apetece e não pela presença da biblioteca ambulante assiduamente na aldeia. Apesar dos intervalos prologados, as histórias saem, muitas vezes estranhando algum abandono em cima (...)
Estamos na semana das Jornadas Mundiais da Juventude, vamos ver, ouvir, falar e ler sobre religião, somos católicos, pouco praticantes, sou um exemplo. Na leitura está distante o dia, do último, talvez, único livro requisitado por uma leitora sobre o tema, foi uma biografia do Papa João Paulo II, na biblioteca ambulante. Esta não possui outros no seu acervo, ninguém os solicita, um peso desnecessário para a tonelagem do veículo, ou uma quantidade de informação que deveríamos (...)
O sol está cruel a meio da manhã, não quero imaginar depois do meio dia e por aí adiante. Abrasador vai afastar as pessoas da rua, não é nada demais, chegamos a meio do ano, na entrada do verão as conversas são sempre as mesmas, o calor. Acontecem com os leitores, mesmo as pessoas das aldeias aproximam-se a reclamarem do exagero do astro. O passado ficou para trás, com ele as temperaturas elevadas dos anos anteriores, é sempre assim, a memória esquece-as, o presente é mais (...)
O calor capturou as aldeias da minha terra, o torpor aprisionou o viajante das viagens e andanças, as palavras prosseguem lentamente a ocuparem o espaço em branco. Há leitores que arriscam exporem-se ao sol para devolverem histórias, não ficarei magoado por quem não vier, compreendo perfeitamente que não queiram encarar o inferno. No verão levar histórias, permanecer na sombra protegido sob a ramagem das árvores, ao sol quando não há outras possibilidades, é (...)
A tarde está estranha, há ribeiros a perderam o sorriso, a água esgota-se, ficam as pedras, camas onde ninguém se quer deitar. Será por isto, que hoje os leitores desistiram de se juntarem com as histórias na biblioteca ambulante. Mencionei a anormalidade a envolver esta parte do dia, possivelmente os leitores caíram neste vazio e não conseguem subir, voltar para as histórias. Sei de um, assíduo leitor, de um momento para o outro, a vida pregou-lhe uma partida, perdeu a mulher, (...)
A charneca está convidativa para ser explorada, caminhar nos trilhos é uma boa opção, de máquina fotográfica à tiracolo, empunha-la para perdurar um momento, uma paisagem, um pequeno animal silvestre capturado de surpresa, este ficará cativo na imagem fotográfica para sempre. Só assim conseguirão continuar a manter as espécies, os disparos fotográficos não deixam rastos de chumbo, de morte, eles seguram depoimentos da vida animal nos terrenos onde crescem plantas rasteiras e (...)
A padeira buzinou a carrinha ao mesmo tempo que o som arrastado do gato a miar, na laranjeira a fruta desprende-se do cordão umbilical puxada pelo vento. O homem preferiu o pão às histórias, compreendo-o, a barriga em primeiro lugar, o resto pode esperar. E é o que a biblioteca ambulante constrói diariamente, a criar hábito na leitura, não é fácil, também não é impossível, o edifício ergue-se devagar, com as fracções a serem ocupadas progressivamente. O sol há muito que (...)
Outro dia com as mesmas histórias a serem lidas em aldeias diferentes a norte e a sul. A ponte, estrutura importante para transpor o rio Tejo, dá acessibilidade à biblioteca ambulante, há vizinhança que habita em ambas as margens. Há sempre histórias verdadeiras para trazer, da feira anual de Alvega, dos vestidos de seda estreados por cada uma nesse dia. Arrumados nos roupeiros, não os perdiam de vista nos dias que antecediam a feira, prognosticando como lhes assentariam no (...)