Está frio na aldeia, em S. Facundo as pessoas na rua estão a tiritar. A aragem fria obriga a aceitar um casaco para proteger os leitores na deslocação à biblioteca ambulante. Não é o caso do viajante das viagens e andanças, vestido com um pólo e umas bermudas. Apresenta uma pele de galinha, não podia exibir-se de outra maneira, estático, sentado no banco, onde recebe os que buscam histórias. O sol não responde aos que estão debaixo dos seus raios de acção. O vento frio (...)
O vento é soberano nas aldeias da minha terra, o horizonte não está totalmente aberto. Um pouco embaciado, há nuvens aqui e ali, espreguiçando-se no céu. O vento chamou-as, deram boleia aos leitores, ainda não vi nenhum hoje, nas viagens e andanças. Andam devagar no céu, está uma sobre a biblioteca ambulante, protege-a por momentos, da bola de fogo que paira no ar. É bom quando as nuvens substituem os panos de lona. O resultado de fazer a vez, é o mesmo que os leitores sentem (...)
As primeiras leituras são como o início das primeiras explorações marítimas, por navegadores, enfrentando as enormes vagas do oceano, em frágeis barcos de madeira. A descobrirem palavras novas, terras desconhecidas, aventuras, até então, possíveis em sonhos. Transpondo páginas, dobrando cabos, sublinhando com o dedo, fixando o padrão. A referenciarem palavras novas, atribuindo terras aos reis, às nações que os enviaram. A leitura é um oceano sem limite, onde é necessário (...)
Estão para breve as festas na aldeia do Vale Zebrinho, na rua principal as paredes de algumas casas foram alvo dos pincéis e das trinchas. Na minha passagem para outra aldeia, a conduzir a biblioteca ambulante, ainda tenho tempo de ver os aldeões a pintar os muros que as resguardam dos olhares curiosos. No local onde se afogam as tristezas, e matam as saudades, anualmente, nos cantos e recantos do espaço, onde se baila, atraem as moças, se dão os primeiros beijos, os beijos fugazes, (...)
A manhã parece ter sido elaborada a partir do branco e do preto. Está melancólica, cinzenta, são as cinzas, do resto do fogo depois do fim de semana, no qual descontraímos com a família e amigos. Houve leitores a levarem de lado para o outro, a repetirem, o empréstimo, das histórias. A temperatura, mais baixa, afrouxou a propagação da primavera, a caminho do verão. As pessoas voltaram a hospedarem-se na roupa quente. Na ribeira o som da água a correr desenfreadamente (...)
Na igreja, o som das mulheres orando ao defunto, chega à biblioteca ambulante na aldeia de S. Facundo. O sino toca, avisando a saída do féretro, iniciando-se, a derradeira viagem deste aldeão em direcção ao cemitério. Não é a melhor maneira de iniciar a crónica, mas a morte também partilha as viagens e andanças. Há leitores alcandorados com o seu saber nas bibliotecas do céu, há subtraídos à vista das histórias. Conhecidos do viajante das viagens e andanças, todos eles (...)
Tenho saudade dos dias de sol, de manhã à noite, das viagens e andanças com letras pelas aldeias da minha terra, embriagadas pelos odores florais, ao longo dos percursos. As pessoas nas aldeias reclamam do excesso de água nas terras cultiváveis, do frio que devora os dias, dos ossos corroídos pela passagem do tempo. A chuva voltou, na aldeia da Ribeira do Fernando, está a molhar as ruas, a biblioteca ambulante, os desprevenidos. A conversa entre os três homens, no acesso à (...)
A súbita, subida da temperatura, esmoreceu o viajante das viagens e andanças. Na biblioteca ambulante, sonha com a praia, a ler numa espreguiçadeira, a refrescar-se nas águas do rio. As portas abertas permitem a circulação do ar fresco, a agilidade dos raios solares penetrarem para beijarem as histórias. Trazerem esperança há presença de mais leitores, de curiosos a espreitarem as novidades nas primeiras páginas dos jornais diários. A propósito das próximas celebrações dos (...)
O vento seca a água da chuva que caiu sobre a estrada nas viagens e andanças, os campos ensopados, a roupa no estendal. O vento é uma máquina de secar memórias, apaga tudo à sua frente, é uma doença, uma borracha não faria melhor. O vento não me deixa voltar ao passado, empurra-me para o futuro. Vou na biblioteca ambulante, com aqueles que presenciaram acontecimentos, lembranças, guardadas para sempre, na escrita, nos livros, cujas páginas amarelecidas o vento não soprou. (...)
A charneca canta e chora de alegria, as plantas selvagens molham as raízes nas pequenas correntes de água, que continuam à superfície do solo. A biblioteca ambulante, acelera nas estradas estreitas, escoltadas por sobreiros e carvalhos, as viagens e andanças prosseguem outra semana pelas aldeias da minha terra. No largo do Café Areias, com vista privilegiada, para a charneca abastada, para uma leitora da biblioteca ambulante, sentada, numa cadeira, na varanda da sua casa, protegida (...)