Dar início ao primeiro dia nas viagens e andanças pelas aldeias da minha terra, desta semana, na biblioteca ambulante, cheia meninos, a começarem os primeiros passos entre as linhas. Palavras gigantes, ilustrações de encher os olhos, exploram os caminhos das letras, tentando desbloquear partes difíceis de transpor. Fantasiando o que vêem nas páginas, descomunais, nas suas pequenas mãos, soletram, empurram com o dedo a história para atingir o final rapidamente. De tarde surgiram (...)
O mês de Junho está de passagem, no espaço intermédio, entre o princípio e o fim deste, conduz um acelarador de vontades, de iniciativas. Evocam-se os Santos, o solstício de verão, casam-se o sagrado e o profano. Há letras no ar, jogos de luzes bailando nas sombras da noite, palavras com sabores a sardinha, a broa de milho. Soltam-se, nos dias de muito aquecimento, ou de muito arrefecimento. Envolvendo-se num abraço ameno, fazendo regressar as pessoas aos bailaricos, às (...)
O ar quente entranha-se no interior da biblioteca ambulante, as silhuetas no horizonte assemelham-se a bailarinos dançando no céu. O som contínuo, dos dragões a sobrevoarem as histórias inquieta-me, o silvo afasta-se, regressa pouco depois, de espreitarem as outras aldeias da minha terra. Temo pelas histórias, quando sopram o fogo. Desconfio, de quem os convocou, o isolamento das terras do interior, a sobranceria dos eleitos. O contentamento, a despreocupação, caminham numa rua (...)
Ler raramente leva a maus comportamentos, o dia de ontem, foi cheio disso mesmo, nas atitudes de muitas pessoas. Aqui, a estrada (nacional nº 2) além de levar forasteiros de passagem para o sul do país, é o principal acesso, onde várias artérias rodoviárias desembocam nesta, vindas da cidade, trazendo e levando abrantinos. O que fizeram alguns automobilistas, levados pela ignorância, estupidamente puseram-se a encher os depósitos de combustível dos automóveis, num posto de (...)
O sol esplendoroso no largo do Cabrito, fez com que este esteja atestado de automóveis estacionados, por pouco, a biblioteca ambulante não tinha espaço para se acomodar. O intervalo do almoço também é aproveitado para conversar na esplanada do café, ao mesmo tempo que se bebe a bica. O calor deixou saudades, hoje, que ele voltou todos querem apanha-lo como podem, experimentar a temperatura alta, na sombra da esplanada, sentados nos degraus do acesso à entrada das suas casas. Tudo, (...)
Ontem vi uma mulher caminhando na margem contrária aquela onde a biblioteca ambulante permanecia, com flores numa das mãos. Soube mais tarde que se dirigia ao cemitério colocar as flores na pedra que cobre a sepultura do seu pai. Nas aldeias as pessoas acreditam em Deus, muitas vezes o convocam, Se Deus quiser; Valha-nos Deus; Oh! Meu Deus; Deus nos acuda; estas manifestações empregam-se muitas vezes, ouço-as nas vozes das leitoras, nas pessoas, Deus está em todo o lado, talvez, (...)
A chuva continua a cair em grande quantidade nas aldeias da minha terra, com fragmentos de terrenos transformados em pequenas lagoas. Os animais não se intimidam com a pluviosidade, com as fuças escondidas na erva, a desbastarem a menos boa, para alcançarem a mais delicada. No Casal da Bica, os cavalos agitam-se, observados pela câmera fotográfica, talvez por saberem que vão ser perpetuados na imagem, personagens numa narração, que deveria ser sobre livros e autores. São (...)
A aldeia mostra fragilidades com o envelhecimento das pessoas, parece agastada. No Brunheirinho excetuando duas mulheres à entrada da mesma, olhando surpreendidas a passagem da biblioteca ambulante. Até ao momento, o merceeiro a buzinar a sua carrinha, não se fez ouvir. Talvez se tenha antecipado ou andará ainda por outros lugares próximos a negociar os produtos alimentares. Sem ele seria difícil a muitas destas pessoas deslocarem-se para adquirirem tudo o que serve para alimentar. (...)
Anda uma abelha na biblioteca ambulante, de um lado para o outro a inspeccionar as histórias, iludida pelas cores das brochuras, julgando serem flores. Um jardim de histórias, de odores, e sabores, néctares aromatizados por óleos da escrita. Palavras ao vento numa pradaria de lembranças, de paixões, poeiras do tempo persistindo na relação com os leitores. Um ecossistema de ligações afectivas, de comportamentos, de capacidades de comunicação. Uma fonte de fascinação para os (...)
Há quem continue a ficar surpreendido, sem saber bem que veículo é este, que estaciona nos sítios mais pequenos, afastados de tudo e de todos. A biblioteca ambulante é uma aventura, é magia, a história das pessoas. Que escrevem, que lêem, dos lugares menos improváveis onde encontrar leitores, da charneca sempre misteriosa, das criaturas esquisitas, folheando o tempo todo com estranhos movimentos nos dedos, concentrados, num objecto mais ou menos volumoso, conforme a área onde (...)